segunda-feira, 17 de março de 2008

A miséria nossa de cada dia

Por total ausência de algo importante a fazer, estava a ouvir um programa partidário local, onde um debate acalorado era travado sobre realidades municipais e um dos participantes, quando indagado sobre um caso de desnutrição neste território bendito e ordeiro, afirmou entre outras coisas que “a África é aqui”.

A declaração é infeliz, embora não incorreta no sentido comparativo e tem uso corriqueiro nos meios de comunicação atuais.

Temos a imagem da África como um continente extremamente pobre e detentor dos maiores índices negativos em todos os aspectos da vida humana. Essa é a imagem que a mídia mundial nos passa e esquecem-se de que grande parte da culpa do que lá ocorre hoje é decorrente de séculos de exploração dos que hoje se arvoram de “defensores da humanidade”, amparados pelo obscurantismo religioso de diversos matizes.

Voltemos ao pronunciamento.

Se for para exemplificar a miséria aqui em Esperantina, não precisa ir tão longe, bastava olhar nos arredores, em outras cidades. Não precisamos de comparações com a África, se temos aqui miséria considerável, made in Brazil, yes.

Não queremos citar nossa cidade em particular para não envergonhar nossa elite e/ou prejudicar o turismo? Ok. Com a visão devidamente obstruída, passaremos então a generalizar e citemos o nordeste brasileiro, tão pródigo em exemplos de miséria, eternizada e romantizada em livros, filmes e reportagens que geram bons dividendos, prêmios, um minuto de indignação e... nada mais.

Aqui, tal qual na África, existem vítimas de séculos de exploração destruidora, perpetuada pela política dos coronéis, a indústria da seca e outras obscenidades, velhas conhecidas nossas, resultantes do jogo de interesses entre a classe política e a “sociedade”, em um processo elitista, opressor, burro e explorador. Também outras regiões do Brasil têm índices alarmantes de miséria, embora isso seja pouco divulgado para não “macular” a imagem de estados poderosos.

Os resultados da discussão não cheguei a ouvir, pois a repetição das mesmas falas em tom monocordioso tem o poder de induzir ao sono o mais abalizado dos ouvintes. Quanto ao debate, infelizmente talvez seja mais balela, gritos no vazio, o tal "enchimento de linguiça".
Indignado, adormeço à espera de notícias do mundo real.

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